Luiz Eduardo Magalhães, Bahia – Brasil
Em meados de abril, diversos Stakeholders dos setores corporativo, financeiro, político e agrícola se reuniram na Bahia para o AARL Cerrado Summit, para dois dias de diálogo e colaboração, buscando desbloquear as barreiras para catalisar a transição em direção a agricultura regenerativa no Cerrado. O evento foi coorganizado pelo World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), Boston Consulting Group (BCG) e o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), em colaboração com o Ministério da Agricultura do Brasil (MAPA) e a Associação de Agricultores e Irrigantes do Estado da Bahia (AIBA).
Como o primeiro evento oficial pré-COP30 realizado no coração do Cerrado, a cúpula reforçou a importância de alinhar as estratégias de implementação através de investimentos, métricas e políticas públicas, buscando alavancar a Presidência brasileira da COP para fazer da COP30 uma conferência de implementação. Também marcou a primeira reunião presencial do Landscape Accelerator Brazil (LAB), o primeiro acelerador regional no âmbito da Agenda de Ação para Paisagens Regenerativas (AARL) criada na COP28.
A Cúpula proporcionou a ocasião para os parceiros da AARL lançarem uma nova e ousada ambição: mobilizar US$ 3 bilhões até 2030 para acelerar a transformação sustentável do Cerrado. Com mais de 150 participantes representando perspectivas muito variadas, a energia era alta na Bahia e as discussões foram detalhadas e orientadas em direção a construção de uma agenda comum. Visitas de campo a projetos de agricultura regenerativas em larga escala e de restauração da vegetação nativa ajudaram a fundamentar o diálogo nas prioridades e nos aspectos práticos dos produtores locais.
Thinking global, acting local
O bioma Cerrado – a potência agrícola do Brasil e a savana mais biodiversa do mundo – é uma região-chave para a expansão da agricultura regenerativas. Este conceito é centrado na prevenção do desmatamento, na regeneração do solo, e na recuperação de terras degradadas, com resultados mensuráveis nas dimensões socioeconómica, climática, hídrica, da saúde do solo e da biodiversidade. E o Brasil está se posicionado para ser um líder devido ao seu conhecimento técnico, produção agrícola em larga escala e crescente demanda global por cadeias de suprimentos sustentáveis.
O secretário de Inovação e Desenvolvimento Sustentável do MAPA, Pedro Neto, destacou a relevância dos temas discutidos durante o AARL Cerrado Summit para a agenda de ação para a agricultura e sistemas agroalimentares, em desenvolvimento para a COP30. “A intenção da agenda de ação é convergir as agendas de biodiversidade, desertificação e clima, e este evento aborda temas centrais para a COP30”.
Finanças: Abordando o défice de investimento
Um dos temas centrais do encontro foi o financiamento da transição para modelos regenerativos. Os participantes examinaram as barreiras que impedem os produtores de adotar práticas regenerativas e enfatizaram a necessidade de estratégias de financiamento misto para reduzir o risco dos investimentos para transição. O BCG apresentou uma análise que estima uma oportunidade de bilhões de dólares para recuperar terras degradadas e melhorar a produtividade através de abordagens regenerativas – destacando o potencial ambiental e económico. O relatório recém-lançado, desenvolvido em colaboração com o WBCSD, CEBDS e MAPA, destacou que a transição do Cerrado representa uma oportunidade de investimento de US$ 55 bilhões até 2050, com uma TIR média de 19%.
Os principais pontos de discussão incluíram:
- O acesso ao financiamento continua sendo uma barreira fundamental, com desafios que incluem altos custos de transição, riscos de mercado e fluxo limitado de capital privado para os pequenos produtores.
- Acordo sobre a necessidade de veículos de investimento adaptados às necessidades locais, construindo novas iniciativas e melhorando as já existentes.
- Foi apresentado um plano ambicioso: Mobilizar US $ 3 bilhões em financiamento misto até 2030 para a agricultura regenerativa no Cerrado
Investir em agricultura regenerativa é de grande importância para a agenda climática global, mas, acima de tudo, fala sobre a resiliência do sistema alimentar e da própria produção agrícola […] A transição para a agricultura regenerativa é fundamental para o crescimento sustentável do setor agrícola no Brasil.
– Fabiana Alvez – CEO, Rabobank Brasil
Métricas e MMRV: abordagens consistentes para acompanhar e incentivar a implementação
Às discussões também abordaram a necessidade de sistemas práticos e económicos de Monitorização, Medição, Relatórios e Verificação (MMRV) para acompanhar o progresso da implementação e recompensar os produtores pela geração de co-benefícios socioeconómicos e ambientais. Os participantes convergiram na necessidade de indicadores padronizados que sejam relevantes, escalonáveis. E adaptados para as realidades locais, com base nas métricas pré-selecionadas facilitadas pelo LAB.
Próximos passos:
- Continuar a promover o alinhamento sobre um conjunto de métricas padronizadas e viáveis para agricultura regenerativa no Brasil
- Desenvolvimento de estudos de caso, e de experiências corporativas na implementação de sistemas de MMRV com produtores no Brasil
- Caminhos futuros: Testes de abordagens de MMRV na prática, com produtos específicos
A primeira coisa é padronizar e harmonizar protocolos. Quantos protocolos diferentes nós temos por aí hoje. E está tudo bem. Diversidade aumenta a resiliência. Mas precisamos padronizar. E precisamos harmonizar. Não, homogeneizar.
– Ludmila Rattis – Pesquisadora, Woodwell Climate, IPAM Amazônia, Fundação Dom Cabral
Políticas públicas: A base para a mudança do sistema
Políticas públicas foram identificadas como um dos fatores chave para a expansão da agricultura regenerativa. Os participantes e palestrantes analisaram as barreiras regulatórias atuais e exploraram como o Brasil pode usar seu papel de anfitrião da COP30 para posicionar a agricultura regenerativa como parte de sua estratégia nacional.
As recomendações incluem:
- Alavancar e expandir os programas de incentivo existentes, como o Plano ABC+ (Agricultura de Baixo Carbono), o Plano Nacional de Recuperação de Pastagens Degradadas (PNCPD) e o Floresta+
- Apoiar a modernização do sistema de cadastro rural (CAR) como um pilar central de sistemas de MMRV custo-effetivos a nível nacional e estadual
- Fortalecer processos colaborativos de formulação de políticas, incluindo empresas, sociedade civil, produtores e instituições de pesquisa.
No âmbito de política pública, a gente tem um plano setorial já consolidado forte, tem uma política de financiamento, tem um produtor rural engajado e com alto grau de empreendedorismo. Tem ciência e inovação disponível, mas há desafios. […] A intenção do governo é criar … um ambiente favorável para uma discussão setorial, que seja, ampla, abrangente.
– Pedro Neto – Secretário de Inovação e Desenvolvimento Sustentável, Ministério da Agricultura (MAPA)
Rumo à COP30: Um plano de ação
Olhando para o futuro, o LAB irá incorporar as perspectivas das discussões realizadas na cúpula do cerrado e alavancar a comunidade de parceiros para apresentar durante a COP30 um conjunto de recomendações que buscam escalar a transição a paisagens regenerativas, apoiado pelo alinhamento multissetorial, estratégias de investimento, e resultados mensuráveis.
Em termos mais gerais, o LAB serve como um modelo para a colaboração entre as vários stakeholders sobre o uso sustentável da terra em contextos tropicais; isso pode catalisar esforços paralelos nos trópicos e ajudar a promover a aprendizagem e a parceria necessárias para a transformação em larga escala dos sistemas alimentares. A iniciativa contribui diretamente para a ambição da Presidência da COP de mostrar como o Brasil pode ser um modelo para o mundo neste momento crítico.
Outline